sexta-feira, 24 de outubro de 2014

A hora da liberdade - Revista Veja Artigo J.R. Guzzo

          O Brasil tem em sua frente, pelos próximos dias, uma escolha bem séria — junto com a opção entre Aécio Neves e Dilma Rousseff, precisará decidir entre democracia e alguma coisa chamada "projeto do PT". Ninguém explicou bem, até agora, o que poderia ser isso. Mas democracia com certeza não é. Não é democracia por um motivo simples: ou um país vive com liberdades individuais e públicas por inteiro, dentro do desenha que todos conhecem e pode ser explicado em menos de cinco minutos, ou vive numa ditadura. Exagero? Não, não é — não quando se quer lidar com ideias descomplicadas. Naturalmente, essa ditadura não requer um general de quepe, bigode preto e óculos escuros na Presidência da República; também não precisa seguir os moldes de Cuba ou da Coreia do Norte. Ela pode ser disfarçada. Pode fingir que é um novo modelo de justiça, no qual ficam dispensados direitos obsoletos que s6 atrapalham a tarefa superior de salvar os bons e punir os pecadores, missão que seria privativa da trinca Lula, PT e Dilma Rousseff. Ou, ainda, pode ser um desses regimes que dividem a liberdade em dois  t ipos, a boa e a ruim — cabendo a quem manda no governo decidir qual é uma e qual é a outra. O problema é que só existe um tipo de democracia: essa aí que temos, com todos os seus vícios, mas melhor que qualquer outro sistema Já tentado até hoje na história. Se não é assim, é tirania, aberta ou oculta. Infelizmente, não há "terceira via". Ou é produto legítimo, ou é produto falso. 
          A nuvem de gás totalitário que se espalha hoje pelo Brasil não é uma questão de palavras ou de opinião; pode ser detectada e medida pela observação direta dos fatos. Os fatos comprovam em alta definição, logo de saída, que o sermão oficial da campanha para a reeleição da presidente tem como alicerce o principal mandamento das ditaduras: "Os únicos votos legítimos são os nossos; todos os demais são viciados, desonestos e vêm de inimigos da vontade popular". A votação do primeiro turno mal tinha terminado e esse bumbo já estava sendo batido por Dilma. "O povo não quer de volta os fantasmas do passado", disse ela. Como assim? O povo tinha acabado de dar 57 milhões de votos a Aécio e Marina Silva, dois candidatos absolutamente de oposição; bem mais, por sinal, do que os 43 milhões dados à candidata oficial. Não é possível, simplesmente, que 57 milhões de brasileiros tenham sentido, justo no dia da eleição, uma súbita vontade de sofrer com a volta de fantasmas. Além disso, considerando que o eleitorado total do país é de 143 milhões de cidadãos, a aritmética mostra que 100 milhões de eleitores, no fim das contas, não votaram em Dilma. 
          Eis aí uma dificuldade e tanto para a doutrina do governo. Segundo o evangelho do PT e dos seus subúrbios, o Brasil de hoje está dividido entre dois lados. Um deles, o lado de Dilma, é o dos pobres, da esquerda e de todos os que querem justiça e progresso; o outro lado, onde ficam os que estão contra a sua candidatura, é o dos ricos, da direita e dos senhores de engenho que querem voltar aos tempos da escravidão. É uma divisão impossível. Pelo que as urnas do dia 5 de outubro acabam de mostrar, 100 milhões de brasileiros — ou no mínimo os 57 milhões que votaram em Aécio e Marina — seriam ricos etc. Que nexo faz uma coisa dessas? Nenhum, mas as ideias totalitárias são exatamente isto: dane-se o nexo, o que interessa é intimidar, agredir e calar a voz de quem discorda delas. Ou "desconstruir" os adversários, como o PT fez com Marina — desconstruiu tão bem, aliás, que acabou construindo Aécio para o segundo turno. Ninguém melhor que Lula para provar que a candidatura oficial não admite pontos de vista contrários. "Eu não entendo como tanta gente quer votar no Alckmin aqui em São Paulo", disse o expresidente, num surto de sinceridade, já no fim da campanha. É exatamente isto: Lula não admite que alguém tenha o direito de preferir um candidato diferente do seu. No caso, Geraldo Alckmin foi eleito pela terceira vez como governador do Estado de São Paulo com quase 60% dos votos: só perdeu em um dos 645 municípios paulistas e só em quatro das 58 zonas eleitorais da capital, enquanto o "poste" que Lula inventou para a disputa foi rejeitado por mais de 80% dos cidadãos que formam o maior eleitorado do Brasil. O que mais seria preciso para provar livremente a existência de uma maioria? Nada, é óbvio — mas o ex-presidente Lula diz que "não entende". Fica-se com a impressão, assim, de que ele acredita num fenómeno fabuloso: 644 municí-pios de São Paulo seriam controlados pelas elites que não se conformam com o bem-estar dos pobres etc. Ou, então, a imensa maioria da população paulista seria composta de idiotas incapazes de votar direito ou entender os próprios interesses. 
          A campanha de Dilma deixou mais do que claro, também, seu maciço empenho em aproveitar todas as oportunidades de falsificar a realidade — outra instrução-chave do manual de regras das ditaduras. Não se trata apenas de inventar que durante o governo Fernando Henrique o Brasil quebrou "três vezes", catástrofe que pelo menos 60% da população nacional não chegou a perceber, ou que Aécio levará o país ao racionamento de energia elé-trica. A marca da maldade, na vida real, está na negação de fatos visíveis para todos, dentro da doutrina segundo a qual qualquer barbaridade acabará ignorada pelo "povão" se os responsáveis disserem, o tempo todo, que não aconteceu nada. Ê exatamente o procedimento adotado por Dilma e sua tropa de apoio diante dos crimes de corrupção cometidos na Petrobras durante os últimos anos. Os dois principais acusados admitiram oficialmente os delitos que praticaram, tanto que recorreram ao benefí-cio da "delação premiada"; a Justiça ainda tem um demorado caminho a seguir até uma avaUação completa do caso, mas a roubalheira está provada acima de qualquer dúvida. A única resposta do governo, até agora, tem sido a falsificação dos fatos e a recusa intransigente em aceitar as verdades mais elementares.             
          Dilma, no caso da Petrobras, parece estar tendo um severo acesso da conhecida doença ocupacional dos governantes totalitários — a fé exagerada na própria capacidade de controlar os acontecimentos. A presidente chegou a dizer, em público, que foi ela quem demitiu da empresa o principal envolvido na ladroagem, o altíssimo diretor que hoje vive equipado com uma tornozeíeira eletrônica para não fugir da cadeia. É falso. Está comprovado que o homem pediu demissão, e foi brindado ao sair com uma salva de elogios oficiais. Dilma sustenta que é praxe permitir que funcionários demitidos do serviço público por justa causa saiam "a pedido". Trata-se de uma desculpa desesperada; se o que a presidente afirmou fosse verdadeiro, o, não dá para entender por que raios o demitido recebeu tantos elogios na saída e menos ainda por qual motivo não foi imediatamente denunciado à polícia e ao Ministério Público. O DNA das tiranias está presente, também, numa das alegações em que Dilma mais insiste: a de que é ela, por seus méritos pessoais, que tem permitido à Polícia Federal e aos promotores de Justiça investigar atos de corrupção em seu governo. Só em regimes de força o chefe do governo permite ou proíbe que a polícia faça isso ou aquilo. Numa democracia, a autoridade policial e judiciária não tem de pedir licença a ninguém para apurar violações ao Código Penal; ao contrário, fazer isso é a sua obrigação legal. 
          As liberdades, como se sabe, raramente se dão bem com a fraude. Mais informações a respeito no dia 26 de outubro. 

terça-feira, 21 de outubro de 2014

DEMOCRACIA do Brasil EM PERIGO.

ENTENDA PORQUE ESTA ELEIÇÃO É DECISIVA PARA O PAÍS.

O texto é longo, mas esclarecedor quanto ao processo de IMPLANTAÇÃO DE UMA DITADURA, AGORA DISFARÇADA SOB O MANTO DE DEMOCRACIA BOLIVARIANA.

PARTIDOS TOTALITÁRIOS EM DEMOCRACIAS CONSTITUCIONAIS
por José Antonio Giusti Tavares

       Nas democracias constitucionais contemporâneas (1) a representação política e o governo são constituídos por dois procedimentos senão diferentes pelo menos independentes entre si, ambos em eleições universais competitivas periódicas e regulares e com mandato por tempo determinado (sistemas presidenciais de governo) – ou a representação política eleita pelo voto popular direto constitui o governo que, diante dela responsável, exercita suas funções enquanto dela detém a confiança, contando entretanto, com a faculdade contraposta de submetê-la a novas eleições (sistemas parlamentares de governo); (2) são instituídos e funcionam efetivamente mecanismos de separação e de contenção recíproca entre os poderes constitucionais, compreendendo, em sua forma superior, a separação entre Chefia de Governo, responsável pela execução das políticas públicas, e Chefia de Estado, responsável pelo equilíbrio da ordem constitucional, bem um Tribunal Constitucional, guardião supremo dos valores e dos preceitos constitucionais supremos; (3) toda autoridade pública detentora de poder constitucional é submetida, em princípio, a mecanismos de responsabilização pública; e, enfim, (4) os direitos individuais, incluído o direito à vida, à liberdade, à propriedade e à associação, são assegurados pela lei constitucional e pelo poder judiciário.

       Os mecanismos institucionais da democracia constitucional são eficazes, sem serem invasivos ou ofensivos, para assegurar o equilíbrio da ordem política e, nela, a liberdade e os direitos fundamentais do ser humano, sem o que não há sequer justiça social. São eficazes, mas são desarmados: são fios de seda, como os denominou Guglielmo Ferrero, o notável jurista, cientista político e historiador liberal italiano da primeira metade do século precedente; e fios de seda não permitem atar o dragão da maldade. Assim, em uma democracia constitucional e representativa, sobretudo quando erodida e fragilizada pela decadência de suas elites, bem como pela corrupção e pela desinformação políticas generalizadas, não só os partidos constitucionais, que se movem nos limites da ordem pública constitucional,  mas aquela  própria ordem, devem enfrentar o paradoxo de que se encontram com freqüência em inferioridade de condições frente aos partidos revolucionários totalitários que,  participando da política institucional, não só não observam aqueles limites mas manifestamente, por suas proposições e por suas atitudes, atentam permanentemente contra aquela ordem. O paradoxo identificado no parágrafo inicial decorre de quatro fenômenos evidentes.

          Em primeiro lugar, a democracia constitucional é a mais complexa e delicada dentre as formas políticas e muito dificilmente pode competir pela preferência do homem comum com o totalitarismo, que recorre a uma simplificação brutal da realidade política, substituindo a informação e a análise racional pelo apelo direto ao inconsciente e à emocionalidade de indivíduos mergulhados em situação de massas. Em segundo lugar, ao participarem da ordem política constitucional os partidos totalitários beneficiam-se das prerrogativas e dos recursos que ela confere, sem obrigar-se aos valores, às regras e aos limites que ela impõe e, sobretudo, sem abrir mão do comportamento revolucionário, conspiratório, insurrecional e golpista. Fora do governo mas, sobretudo, ao ocupá-lo, adotam simplesmente a estratégia leninista-trotskista da dualidade de poder, que consiste em conspirar pelo alto, do interior das instituições, e mobilizar de baixo, mobilizando camadas sociais disponíveis e receptivas e, enfim, gerando pressões societárias, inclusive armadas.

         Este é o caso exemplar, no Brasil, do Partido dos Trabalhadores e de seu braço armado, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, como revela a Circular do Diretório Nacional na qual aquele partido justificava a sua recusa inicial de obrigar-se à Constituição de 1988, que consagrava as normas e as instituições da ordem constitucional estabelecida: “O PT, como partido que almeja o socialismo, é por natureza um partido contrário à ordem burguesa, sustentáculo do capitalismo. (...) rejeita a imensa maioria das leis que constituem a institucionalidade que emana da ordem burguesa capitalista, ordem que o partido justamente procura destruir". Ainda em  1988, o atual governador petista do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, sustentou, com a sua conhecida competência doutrinária, na revista partidária "Teoria e Debate" (n°4,pp. 38-41), a estratégia leninista-troskista da dualidade de poder: “...o partido deve responder às exigências  de uma longa disputa pela hegemonia (...) com a construção de uma cultura política e de uma ideologia socialista em bolsões altamente organizados daqueles setores revolucionários, em direção a uma ruptura com o Estado burguês... com respostas dentro e fora da ordem (...), sob pena de limitar-se aos enfrentamentos na esfera política das instituições da ordem, sendo inexoravelmente sugado por ela".

        A noção gramsciana, ultra-leninista, de hegemonia, muito difundida na América Latina, significa poder monopólico e é, portanto, absolutamente incompatível com o pluralismo político essencial à democracia constitucional. Alguém muito complacente poderia objetar às citações acima que elas pertencem ao ano de 1988 e que, entrementes, o partido e o político que as enunciaram podem ter alterado suas atitudes políticas. A objeção seria pueril mas respondê-la introduz a oportunidade de pontuar um princípio elementar. Partidos e homens públicos têm a responsabilidade de publicar não só as suas concepções e estratégias políticas, mas as revisões ou mudanças que, quanto àquelas, tenham feito. Em 1959, no Congresso de Bad Godesberg, o Partido Social-Democrata Alemão declarou, em um documento formal amplamente divulgado, que a partir daquele momento renunciava a qualquer tipo de confessionalismo político e, em particular, à noção de partido portador de uma teoria, exorcizando, assim, o fantasma do marxismo.

         O fato de que o PT ou mesmo qualquer de seus próceres jamais tenha revisto formal e publicamente as concepções originárias do partido, tendo mesmo recusado a comprometer-se com o pacto constitucional de 1988, revela que lamentavelmente está ainda viva a estratégia revolucionária totalitária que fora enunciada naquele ano. Ademais, ao longo dos doze anos do governo petista, as  tentativas sucessivamente frustradas de violar os princípios, as normas e as instituições da democracia constitucional e representativa – entre as quais o Programa Nacional de Direitos Humanos III, de 2009, e a Política Nacional de Participação Social, de 2014 – demonstram claramente que não há ambigüidade que consiga ocultar o empenho continuado e cada vez mais radical, por parte do neocomunismo petista, de destruir a democracia representativa e constitucional edificada com tanto esforço, substituindo-a por uma democracia plebiscitária e totalitária. Em terceiro lugar, os cidadãos comuns, que participam dos partidos constitucionais ou com eles  se identificam, partilham a sua dedicação, as suas energias e a sua lealdade entre múltiplas atividades e associações, entre as quais a política e os partidos possuem uma importância limitada, ocupando mesmo um espaço menor.

          Não há nessa atitude nada de errado. Ao contrário, como já Aristóteles observara, a participação política moderada constitui requisito fundamental da democracia constitucional, que o filósofo denominava  simplesmente politéia. Contudo, pertence à natureza e à lógica dos partidos totalitários apelar para a participação e para a mobilização políticas permanentes, para o profissionalismo e para o ativismo revolucionários de tempo integral e, enfim, para a politização da totalidade das esferas da existência, incluídas aquelas mais íntimas. Enfim, em quarto lugar, a compreensão adequada dos valores sobre os quais está fundada a democracia constitucional e das normas e das instituições com as quais opera, bem como dos processos econômicos por referência aos quais se definem as  políticas públicas e o comportamento dos partidos nas sociedades democráticas contemporâneas, exige dos indivíduos, em virtude de sua complexidade e sutileza, um nível muito elevado de discernimento intelectual, que se encontra normalmente fora do alcance da informação e do entendimento do  homem comum.

       A rigor, a participação racional e responsável nas decisões democráticas exige do cidadão um nível relativamente elevado de  informação factual, de saber contextual e de saber estrutural, que ele normalmente não possui. Sob tais condições, a democracia constitucional muito dificilmente pode  competir pela preferência do homem comum com o totalitarismo, que recorre  a uma simplificação brutal da realidade política e econômica, substituindo a informação e a análise racional pela ideologia, um  “saber” de custo próximo de zero, que contém, por outro lado, um apelo direto à emocionalidade e ao inconsciente de indivíduos mergulhados em  situação de massa. Enfim, o exercício da liberdade e da responsabilidade públicas, inerente à democracia constitucional, implica em assumir custos e riscos, requerendo dos indivíduos um grau pouco comum de segurança psicológica que lhes permita conviver com a incerteza.

         O recurso normal para reduzir a incerteza e os riscos é provido pela informação factual e pelos saberes contextual e estrutural, o que envolve custos imediatos e a médio e longo prazo, que os indivíduos que pertencem aos segmentos mais baixos da sociedade não podem assumir.  Assim, para a maioria das pessoas, pouco capazes de conviver com  a incerteza e suportar os riscos inerentes à liberdade pessoal e pública, a ideologia totalitária proporciona uma explicação omnicompreensiva da realidade e da história, que lhes restaura magicamente e a baixo custo a segurança; e o partido ou o movimento totalitário, que a interpreta nos diferentes casos, provê uma autoridade externa onipotente que retira daquelas pessoas o inquietante peso da liberdade de decidir. Diante desse desigual e insólito desafio as democracias constitucionais mais avançadas e sólidas armam-se com recursos previstos na lei constitucional, o mais importante dos quais é a proscrição de partidos políticos que promovem, estimulam ou apóiam processos conspiratoriais ou qualquer outra forma de violência política: a cláusula de constitucionalidade dos partidos, contida no art. 21,(2) da Constituição da República Federal da Alemanha e eficazmente aplicada pelo seu Tribunal  Constitucional, é o exemplo de maior proeminência: “Os partidos que por suas finalidades ou pelas atitudes de seus partidários tentam desvirtuar ou eliminar o regime fundamental de democracia e de liberdade, ou pôr em perigo a existência da República Federal, são inconstitucionais”.

         É verdade que a Constituição Brasileira contém uma cláusula semelhante: o artigo 17 estatui, em  seu caput, como requisito para a existência dos partidos políticos, a fidelidade ao “regime democrático”, ao “pluripartidarismo” e aos “direitos fundamentais da pessoa humana”, estabelecendo, no inciso II, “a proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes”; e, enfim, no § 4º, veda “a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar”.  Resta aplicá-lo. Se, entretanto, um supremo esforço de esclarecimento não  conseguir persuadir o eleitor comum que a democracia constitucional, conquistada a duras penas mas perversamente disputada, deve ser preservada, quaisquer que sejam as suas vicissitudes – então, a manipulação populista de justos descontentamentos e o ilusionismo messiânico pavimentarão o caminho auto-destrutivo que, exaurido em Cuba, está sendo trilhado no continente sul-americano pela Venezuela, pelo Equador, pela Bolívia, pela Argentina e pelo Brasil. Não tenhamos ilusão. Eleições universais geram legitimidade democrática, mas não legitimidade constitucional.

       Como profetizou com acerto Alexis de Tocqueville, na ausência de sólidas e vigorosas instituições de representação política e de separação dos poderes constitucionais, incluindo a separação entre Chefia de Estado e a Chefia do Governo, bem como um Tribunal Constitucional, eleições plebiscitárias provêm a ante-sala do bonapartismo e da democracia totalitária. Eleições e reeleições consecutivas provêm um claro e importante contributo a governos populistas empenhados em programas de distribuição direta e ostensiva da renda nacional em benefício das populações pobres ou na linha da miséria. Aparentemente empenhados na eliminação da pobreza, esses governos têm clara consciência de que sua perpetuação no poder é alimentada pela pobreza e dela necessitam, do que decorre que, na realidade, empenham-se não em eliminar a miséria, mas em mantê-la estável e dependente, aguardando-a nas urnas.

      Sob tais condições é altamente improvável que eleições fortaleçam a democracia constitucional; ao contrário, há alta probabilidade de que contribuam poderosamente para destruí-la. A experiência histórica registra importantes casos em que o totalitarismo ocupou o Estado pela via eleitoral, entre os quais o fascismo italiano e o nacional-socialismo alemão, nenhum dos dois foi debelado pela força da sociedade que aprisionara; ao contrário, ambos foram eliminados pela derrota  militar infligida de fora, por nações invasoras.

José Antônio Giusti Tavares - Professor de Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisador Associado no Centre d’Études et de Recherches Internationales, Fondation Nationale des Sciences Politiques, Paris,em 1985 e 1986. Guest Scholar em 1998,e Visiting Fellow, em 2002, do Helen Kellogg Institute for International Studies, Notre Dame University, Indiana, US.

FONTE: videVERSUS - 17/10/2014